Autoestima: Uma possível construção


Inúmeros livros de autoajuda buscam ensinar o amor a si mesmo e como elevar a autoestima. Mas, será que o amor-próprio é algo que se aprende?

Para a psicanálise lacaniana, o EU é constituído a partir do olhar do Outro. Quem já não presenciou o júbilo de um bebê quando tem cerca de seis meses e descobre sua imagem no espelho? Segundo o psicanalista e pediatra W. D. Winnicott, a base da construção da autoestima do pequeno será solidificada se a pessoa constante em seus cuidados o vê como um SER especial e respeita sua singularidade. No início da vida, o olhar dos cuidadores investe o bebê da ilusão de completude. O pequenino é dependente, não tem o controle dos esfíncteres, não anda, não fala, usa babador. Ainda assim, é fofo e encantador.

A questão é que nem todos recebem esse olhar.

D. W. Winnicott acrescenta, através de sua teoria e prática clínica, que a base da segurança é passada na forma como o bebê é manejado, carregado, trocado, embalado em seu dia a dia. Trata-se do principal cuidador conseguir identificar-se com seu bebê e fornecer-lhe o que solicita quando ele demanda, sem forçá-lo. O bebê pode, então, acreditar na ilusão de que cria o mundo, de que é um pequeno deus. Essa ilusão primeira é necessária, é a base da possibilidade de, futuramente, acreditar em si e na prosperidade. Em linguagem comum, o bebê é otimista ao extremo, para que depois possa acreditar que o mundo lhe oferecerá coisas boas. 

Gradativamente, ao longo dos meses, o bebê será capaz de criar um espaço de espera e, aos poucos, irá  lidar com as frustrações inerentes da relação cuidador(es)-bebé.  Pois é impossível e nem seria saudável que, após os primeiros meses, ele continuasse sendo satisfeito a cada gesto. Portanto, fará parte do seu desenvolvimento saudável as frustrações e o aparelho psíquico estará em desenvolvimento para acompanhar estas mudanças desde que os cuidadores saibam acolher e nomear seus medos, suas  dores e seus mal-estares. Estando consolidada a ilusão, a desilusão pode advir com sustentação do ambiente à sua volta.

A questão é que algumas pessoas não experimentaram  a beatitude de um bom começo. E, nesses casos, a base do amor-próprio não está presente. No seu lugar, mora o vazio e a dor. Às vezes, nessas pessoas, advém a melancolia, como uma dinâmica de personalidade que se pune, culpa, não acredita em si e na sua capacidade. O bebê começa a andar, torna-se uma criança e tenderá a repetir situações que o levam ao desamor, embora sua busca seja por amor. 

A criança terá outras vivências na escola, com amigos, parentes, vizinhos, entre esses uma pessoa poderá se destacar e lhe oferecer um olhar valoroso. Ocasionalmente, a criança poderá reter alguns gestos que a ajudem a constituir sua autoestima. Entretanto, lembremos que a base dessa autoestima faltou a essa criança. E, se os pais ainda não conseguiram amar seu filho como ele é, sem exigir que seja um outro, ou são indiferentes a ele, tudo ficará mais difícil.

Algumas pessoas chegam assim à vida adulta, com amores frustrados, sem conseguir amar a si mesmas. Nesses casos, um psicólogo ou psicanalista habilidoso, e não sem afeto, poderá ajudá-las nessa jornada.

Não acredito que se possa aprender a amar-se por meio de um manual, mas sim através das relações com o outro, das novas e inúmeras oportunidades que a vida nos oferece. Para tanto, é necessário abrir-se e arriscar-se ao inédito, ao não vivido. É preciso buscar força suficiente para se permitir encontros fundamentais, com o outro, com a arte, com a vida. Acreditar que nunca é tarde. Tudo isso dará trabalho; contudo, adultos, podemos enxergar nossos feitos e nos orgulhar, inclusive, de termos transformado o negativo do início em positividade. É um ganho a mais para Eros, que, segundo Freud – o pai da psicanálise –, promovia tudo o que diz respeito à vida, à união e à ligação.




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Ana Amorim de  Farias, 2009
Psicóloga e Psicanalista
Adultos e Casais

Psicóloga Ana Amorim de Farias

CRP 06/39859-9

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