“Em si, a dor não tem nenhum valor nem significado. Ela está ai, feita de carne ou pedra, e no entanto, para acalmá-la, temos que tomá-la como a expressão de outra coisa, destacá-la do real, transformá-la em símbolo. Atribuir um valor simbólico a uma dor que em si é puro real, emoção brutal, hostil e estranha , é enfim o único gesto terapêutico que a torna suportável. Assim, o psicanalista é intermediário que acolhe a dor inassimilável do paciente, e a transforma em dor simbolizada.
Mas o que significa então dar um sentido à dor e simboliza-la? Não é, de modo algum, propor uma interpretação forçada da sua causa, nem mesmo consolar o sofredor, e menos ainda estimula-lo a atravesar a sua pena como uma experiência formadora, que fortaleceria o seu caráter. Não; dar um sentido à dor do outro significa, para o psicanalista, afinar-se com a dor, tentar vibrar com ela, e , nesse estado de ressonância, esperar que o tempo e as palavras se gastem, Com o paciente transformado nessa dor, o analista age como um bailarino que, diante do tropeço de sua parceira, a segura, evita que ela caia, e, sem perder o passo, leva o casal a reencontrar o ritmo inicial. Dar um sentido a uma dor insondável é finalmente construir para ela um lugar no seio da transferência, onde ela poderá ser clamada, pranteada e gasta com lágrimas e palavras.”
(O Livro da Dor e do Amor, J-D.Nasio, p.17, Rio de Janeiro: Zahar Ed.,1997)