A psicanalista Maria Rita Kelh
A depressão é uma forma muito particular e
avassaladora daquilo que corriqueiramente chamamos a dor de viver.
Juntamente com a angústia e a dor propriamente dita, é uma constelação
de afetos tão familiar que, como escreve Daniel Delouya, dificilmente
conseguimos classificá-la entre os quadros clínicos da psicopatologia. À
dor do tempo que corre arrastando consigo tudo o que o homem constrói,
ao desamparo diante da voragem da vida que conduz à morte – que para o
homem moderno representa o fim de tudo – a depressão contrapõe um outro
tempo, já morto: um “tempo que não passa”, na expressão de J. Pontalis.
avassaladora daquilo que corriqueiramente chamamos a dor de viver.
Juntamente com a angústia e a dor propriamente dita, é uma constelação
de afetos tão familiar que, como escreve Daniel Delouya, dificilmente
conseguimos classificá-la entre os quadros clínicos da psicopatologia. À
dor do tempo que corre arrastando consigo tudo o que o homem constrói,
ao desamparo diante da voragem da vida que conduz à morte – que para o
homem moderno representa o fim de tudo – a depressão contrapõe um outro
tempo, já morto: um “tempo que não passa”, na expressão de J. Pontalis.
O psiquismo, acontecimento que acompanha
toda a vida humana sem se localizar em nenhum lugar do corpo vivo, é o
que se ergue contra um fundo vazio que poderíamos chamar,
metaforicamente, de um núcleo de depressão. O núcleo de nada onde o
sujeito tenta instalar, fantasmaticamente, o objeto perdido – objeto
que, paradoxalmente, nunca existiu.
toda a vida humana sem se localizar em nenhum lugar do corpo vivo, é o
que se ergue contra um fundo vazio que poderíamos chamar,
metaforicamente, de um núcleo de depressão. O núcleo de nada onde o
sujeito tenta instalar, fantasmaticamente, o objeto perdido – objeto
que, paradoxalmente, nunca existiu.
A rigor, a vida não faz sentido e nossa
passagem por aqui não tem nenhuma importância. A rigor, o eu que nos
sustenta é uma construção fictícia, depende da memória e também do olhar
do outro para se reconhecer como uma unidade estável ao longo do tempo.
A rigor, ninguém se importa tanto com nossas eventuais desgraças a
ponto de conseguir nos salvar delas. Contra este pano de fundo de
nonsense, solidão e desamparo, o psiquismo se constitui em um trabalho
permanente de estabelecimento de laços – “destinos pulsionais”, como se
diz em psicanálise – que sustentam o sujeito perante o outro e diante de
si mesmo.
passagem por aqui não tem nenhuma importância. A rigor, o eu que nos
sustenta é uma construção fictícia, depende da memória e também do olhar
do outro para se reconhecer como uma unidade estável ao longo do tempo.
A rigor, ninguém se importa tanto com nossas eventuais desgraças a
ponto de conseguir nos salvar delas. Contra este pano de fundo de
nonsense, solidão e desamparo, o psiquismo se constitui em um trabalho
permanente de estabelecimento de laços – “destinos pulsionais”, como se
diz em psicanálise – que sustentam o sujeito perante o outro e diante de
si mesmo.
Freudianamente falando, a subjetividade é
um canteiro de ilusões. Amamos: a vida, os outros, e sobretudo a nós
mesmos. Estamos condenados a amar, pois com esta multiplicidade de laços
libidinais tecemos uma rede de sentido para a existência. As diversas
modalidades de ilusões amorosas, edipianas ou não, são responsáveis pela
confiança imaginária que depositamos no destino, na importância que
temos para os outros, no significado de nossos atos corriqueiros. Não
precisamos pensar nisso o tempo todo; é preciso estar inconsciente de
uma ilusão para que ela nos sustente.
um canteiro de ilusões. Amamos: a vida, os outros, e sobretudo a nós
mesmos. Estamos condenados a amar, pois com esta multiplicidade de laços
libidinais tecemos uma rede de sentido para a existência. As diversas
modalidades de ilusões amorosas, edipianas ou não, são responsáveis pela
confiança imaginária que depositamos no destino, na importância que
temos para os outros, no significado de nossos atos corriqueiros. Não
precisamos pensar nisso o tempo todo; é preciso estar inconsciente de
uma ilusão para que ela nos sustente.
A depressão é o rompimento desta rede de
sentido e amparo: momento em que o psiquismo falha em sua atividade
ilusionista e deixa entrever o vazio que nos cerca, ou o vazio que o
trabalho psíquico tenta cercar. É o momento de um enfrentamento
insuportável com a verdade. Algumas pessoas conseguem evitá-lo a vida
toda. Outras passam por ele em circunstâncias traumáticas e saem do
outro lado. Mas há os que não conhecem outro modo de existir; são órfãos
da proteção imaginária do “amor”, trapezistas que oscilam no ar sem
nenhuma rede protetora embaixo deles. “A depressão é uma imperfeição do
amor”, escreve Andrew Solomon, autor de “O demônio do meio-dia”, vasto
tratado sobre a depressão publicado nos Estados Unidos e traduzido no
Brasil no final de 2002. Faz sentido, se considerarmos o sentido mais
amplo da palavra amor.
sentido e amparo: momento em que o psiquismo falha em sua atividade
ilusionista e deixa entrever o vazio que nos cerca, ou o vazio que o
trabalho psíquico tenta cercar. É o momento de um enfrentamento
insuportável com a verdade. Algumas pessoas conseguem evitá-lo a vida
toda. Outras passam por ele em circunstâncias traumáticas e saem do
outro lado. Mas há os que não conhecem outro modo de existir; são órfãos
da proteção imaginária do “amor”, trapezistas que oscilam no ar sem
nenhuma rede protetora embaixo deles. “A depressão é uma imperfeição do
amor”, escreve Andrew Solomon, autor de “O demônio do meio-dia”, vasto
tratado sobre a depressão publicado nos Estados Unidos e traduzido no
Brasil no final de 2002. Faz sentido, se considerarmos o sentido mais
amplo da palavra amor.
Durante cinco anos, Solomon dedicou-se a
pesquisar a depressão: causas e efeitos, tratamentos, hipóteses
bioquímicas, estatísticas. Recolheu histórias de vida de dezenas de
pessoas que passaram por crises depressivas – “nunca escrevi sobre um
assunto a respeito do qual tantos tivessem tanto a dizer”. A estas,
acrescentou sua própria história – o trabalho no livro foi uma forma de
reação ao longo período em que ele próprio passou por sérias crises
depressivas. Um período em que, nas palavras do autor, “cada segundo de
vida me feria”.
pesquisar a depressão: causas e efeitos, tratamentos, hipóteses
bioquímicas, estatísticas. Recolheu histórias de vida de dezenas de
pessoas que passaram por crises depressivas – “nunca escrevi sobre um
assunto a respeito do qual tantos tivessem tanto a dizer”. A estas,
acrescentou sua própria história – o trabalho no livro foi uma forma de
reação ao longo período em que ele próprio passou por sérias crises
depressivas. Um período em que, nas palavras do autor, “cada segundo de
vida me feria”.
A julgar pelos números recolhidos por
Solomon em relatórios da divisão de saúde mental da Organização Mundial
de Saúde – o DSM-IV – esta ferida acomete a um número cada vez maior de
pessoas no mundo, e particularmente nos Estados Unidos. 3% da população
norte americana sofre de depressão crônica – cerca de 19 milhões de
pessoas, das quais 2 milhões são crianças. A depressão é a principal
causa de incapacitação em pessoas acima de cinco anos de idade. 15% das
pessoas deprimidas cometerão suicídio. Os suicídios entre jovens e
crianças de 10 a 14 anos aumentaram 120% entre 1980 e 1990. No ano de
1995, mais jovens norte-americanos morreram por suicídio do que de da
soma de câncer, Aids, pneumonia, derrame, doenças congênitas e doenças
cardíacas.
Solomon em relatórios da divisão de saúde mental da Organização Mundial
de Saúde – o DSM-IV – esta ferida acomete a um número cada vez maior de
pessoas no mundo, e particularmente nos Estados Unidos. 3% da população
norte americana sofre de depressão crônica – cerca de 19 milhões de
pessoas, das quais 2 milhões são crianças. A depressão é a principal
causa de incapacitação em pessoas acima de cinco anos de idade. 15% das
pessoas deprimidas cometerão suicídio. Os suicídios entre jovens e
crianças de 10 a 14 anos aumentaram 120% entre 1980 e 1990. No ano de
1995, mais jovens norte-americanos morreram por suicídio do que de da
soma de câncer, Aids, pneumonia, derrame, doenças congênitas e doenças
cardíacas.
Esta forma de mal estar tende a aumentar,
na proporção direta da oferta de tratamentos medicamentosos: há vinte
anos, 1,5% da população dos Estados Unidos sofria de depressões que
exigiam tratamento. Hoje este número subiu para 5%. Sincero adepto dos
tratamentos farmacológicos, que segundo ele salvaram sua vida, Andrew
Solomon acaba por se perguntar se a doença cresce com o desenvolvimento
da medicina ou se a indústria farmacêutica produz as doenças para os
remédios que desenvolve, do mesmo modo que outros ramos industriais
criam mercados para seus produtos.
na proporção direta da oferta de tratamentos medicamentosos: há vinte
anos, 1,5% da população dos Estados Unidos sofria de depressões que
exigiam tratamento. Hoje este número subiu para 5%. Sincero adepto dos
tratamentos farmacológicos, que segundo ele salvaram sua vida, Andrew
Solomon acaba por se perguntar se a doença cresce com o desenvolvimento
da medicina ou se a indústria farmacêutica produz as doenças para os
remédios que desenvolve, do mesmo modo que outros ramos industriais
criam mercados para seus produtos.
Insight sem inconsciente?
A contribuição das terapias
medicamentosas no tratamento das doenças mentais é inegável, e o
analista, assim como outros “terapeutas da fala” no dizer de Solomon,
não pode dispensá-la. “O Prozac não deveria tornar o insight
dispensável,”, diz Robert Klitzman, da Universidade de Colúmbia, citado
pelo autor. “Deveria torná-lo possível”.
medicamentosas no tratamento das doenças mentais é inegável, e o
analista, assim como outros “terapeutas da fala” no dizer de Solomon,
não pode dispensá-la. “O Prozac não deveria tornar o insight
dispensável,”, diz Robert Klitzman, da Universidade de Colúmbia, citado
pelo autor. “Deveria torná-lo possível”.
Mas qual o insight possível, capaz de
produzir efeitos sobre a subjetividade, em uma cultura onde as práticas
de linguagem se impõem fortemente de modo a apagar o sujeito do
inconsciente? As histórias de pacientes depressivos enumeradas por
Andrew Solomon centram-se ao redor da perspectiva única do vitimismo. As
pessoas se deprimem porque não suportam o que foi feito a elas.
Acidentes, perdas traumáticas, abandonos, violência, abuso sexual na
infância; é de fora para dentro que a vida psíquica se impõe àqueles que
sofrem de mal estar.
produzir efeitos sobre a subjetividade, em uma cultura onde as práticas
de linguagem se impõem fortemente de modo a apagar o sujeito do
inconsciente? As histórias de pacientes depressivos enumeradas por
Andrew Solomon centram-se ao redor da perspectiva única do vitimismo. As
pessoas se deprimem porque não suportam o que foi feito a elas.
Acidentes, perdas traumáticas, abandonos, violência, abuso sexual na
infância; é de fora para dentro que a vida psíquica se impõe àqueles que
sofrem de mal estar.
É óbvio que a rede de proteção do
psiquismo pode ser rompida pelas irrupções traumáticas do real; mas as
“desgraças da vida” recaem sempre sobre um sujeito, incidem sobre uma
posição desejante e são rearticuladas pelas formações do inconsciente,
que são formações da linguagem. Do ponto de vista do vitimismo, a cura
da depressão consiste na eliminação de todo traço de “má notícia” que
advenha do inconsciente. A psiquiatria e a indústria farmacêutica
aliam-se a este ponto de vista. “Assistimos a um conluio curioso entre a
descrição psiquiátrica e a própria queixa do deprimido”, escreve
Delouia. “A ignorância a respeito do psíquico “une o fenômeno depressivo
com a parafernália nosográfica da psiquiatria”.
psiquismo pode ser rompida pelas irrupções traumáticas do real; mas as
“desgraças da vida” recaem sempre sobre um sujeito, incidem sobre uma
posição desejante e são rearticuladas pelas formações do inconsciente,
que são formações da linguagem. Do ponto de vista do vitimismo, a cura
da depressão consiste na eliminação de todo traço de “má notícia” que
advenha do inconsciente. A psiquiatria e a indústria farmacêutica
aliam-se a este ponto de vista. “Assistimos a um conluio curioso entre a
descrição psiquiátrica e a própria queixa do deprimido”, escreve
Delouia. “A ignorância a respeito do psíquico “une o fenômeno depressivo
com a parafernália nosográfica da psiquiatria”.
O autor não deixa de ser crítico em
relação a esta perspectiva. “Nós patologizamos o curável. Quando existir
uma droga contra a violência, ela será encarada como uma doença”.
Também é crítico em relação ao ideal de remoção química de toda a dor de
existir. No entanto, a ingenuidade a respeito da realidade psíquica
prevalece até mesmo em relação à sua própria crise depressiva. Filho de
uma mulher ativa e absorvente, que mais tarde ele próprio pode perceber
como depressiva, Andrew Solomon participou, junto com o pai e o irmão,
do suicídio assistido da mãe, vítima de câncer no ovário aos 58 anos.
Depois dessa morte, dramática e intensamente estetizada, a fantasia de
suicídio ocorre aos outros membros da família. No ano seguinte, Solomon
inicia uma análise com uma mulher que lhe lembra a mãe, e propõe a ela
um pacto incondicional: não abandonarão o tratamento até o “fim”, sob
nenhuma condição. Mas alguns anos depois,a analista anuncia ao dedicado
analisando que vai deixar o trabalho. Aposentadoria por tempo de
serviço…
relação a esta perspectiva. “Nós patologizamos o curável. Quando existir
uma droga contra a violência, ela será encarada como uma doença”.
Também é crítico em relação ao ideal de remoção química de toda a dor de
existir. No entanto, a ingenuidade a respeito da realidade psíquica
prevalece até mesmo em relação à sua própria crise depressiva. Filho de
uma mulher ativa e absorvente, que mais tarde ele próprio pode perceber
como depressiva, Andrew Solomon participou, junto com o pai e o irmão,
do suicídio assistido da mãe, vítima de câncer no ovário aos 58 anos.
Depois dessa morte, dramática e intensamente estetizada, a fantasia de
suicídio ocorre aos outros membros da família. No ano seguinte, Solomon
inicia uma análise com uma mulher que lhe lembra a mãe, e propõe a ela
um pacto incondicional: não abandonarão o tratamento até o “fim”, sob
nenhuma condição. Mas alguns anos depois,a analista anuncia ao dedicado
analisando que vai deixar o trabalho. Aposentadoria por tempo de
serviço…
No tempo de análise que lhe resta, Andrew
Solomon não entende por que vai entrando em depressão cada vez mais
grave, até que a própria analista concorda em que ele busque auxílio
psiquiátrico. A análise “termina” pouco depois, e ele atravessa um ciclo
de depressões gravíssimas. A inabilidade da analista de Solomon quanto
ao manejo da transferência diante de um quadro de luto melancólico salta
aos olhos do leitor familiarizado com a psicanálise. Não é sem razão
que ele escreve, anos mais tarde, que a psicanálise seja “hábil para
explicar, mas não eficiente para mudar” os quadros depressivos.
Solomon não entende por que vai entrando em depressão cada vez mais
grave, até que a própria analista concorda em que ele busque auxílio
psiquiátrico. A análise “termina” pouco depois, e ele atravessa um ciclo
de depressões gravíssimas. A inabilidade da analista de Solomon quanto
ao manejo da transferência diante de um quadro de luto melancólico salta
aos olhos do leitor familiarizado com a psicanálise. Não é sem razão
que ele escreve, anos mais tarde, que a psicanálise seja “hábil para
explicar, mas não eficiente para mudar” os quadros depressivos.
A julgar pelo relato de Solomon, seu
tratamento psicanalítico foi baseado na reconstituição da vida infantil,
em busca de um causalidade psíquica que, de fato, pode ter valor
explicativo mas não produz nenhuma intervenção sobre o psiquismo vivo e
ativo no sujeito adulto. Pierre Fédida, em seu livro sobre a depressão,
adverte sobre os riscos de se buscar a evocação de um “acontecimento
real que se supõe empiricamente traumático: a vivência infantil –
essencialmente inatual na fala associativa – recebe assim uma
positividade patogênica, na forma de uma atualidade passada”. O
“infantil” que interessa à psicanálise não é o do passado, rememorado
pelo eu, mas o que se manifesta ao vivo na transferência, nas demandas
dirigidas ao analista. Como a analista de Solomon não se deu conta da
relação entre a proposta de uma análise incondicional feita por ele, o
amor pela mãe e o pacto de morte que o uniu a ela? Como não se deu conta
da relação entre a crise depressiva de seu analisante e o anúncio
burocrático de sua “aposentadoria”?
tratamento psicanalítico foi baseado na reconstituição da vida infantil,
em busca de um causalidade psíquica que, de fato, pode ter valor
explicativo mas não produz nenhuma intervenção sobre o psiquismo vivo e
ativo no sujeito adulto. Pierre Fédida, em seu livro sobre a depressão,
adverte sobre os riscos de se buscar a evocação de um “acontecimento
real que se supõe empiricamente traumático: a vivência infantil –
essencialmente inatual na fala associativa – recebe assim uma
positividade patogênica, na forma de uma atualidade passada”. O
“infantil” que interessa à psicanálise não é o do passado, rememorado
pelo eu, mas o que se manifesta ao vivo na transferência, nas demandas
dirigidas ao analista. Como a analista de Solomon não se deu conta da
relação entre a proposta de uma análise incondicional feita por ele, o
amor pela mãe e o pacto de morte que o uniu a ela? Como não se deu conta
da relação entre a crise depressiva de seu analisante e o anúncio
burocrático de sua “aposentadoria”?
O livro de Solomon não oferece nenhuma
contribuição decisiva para o conhecimento da depressão, mas lança uma
luz importante sobre as relações entre a emergência epidêmica dessa
forma de mal estar e os modos de subjetivação predominantes na cultura
norte-americana. Em uma sociedade onde as formações discursivas apagam o
sujeito do inconsciente, em que a felicidade e o sucesso são
imperativos superegóicos, a depressão emerge – como a histeria na
sociedade vitoriana – como sintoma do mal estar produzido e oculto pelos
laços sociais. O vazio depressivo, que em muitas circunstâncias pode
ser compensado pelo trabalho psíquico, é agravado em função do
empobrecimento da subjetividade, característico das sociedades
consumistas e altamente competitivas. A “vida sem sentido” de que se
queixam os depressivos só pode ser compensada pela riqueza do trabalho
subjetivo, ao preço de que o sujeito suporte, amparado simbolicamente
pelo analista, seu mal estar. A eliminação farmacológica de todas as
formas de mal estar produz também, paradoxalmente, o apagamento dos
recursos de que dispomos para dar sentido à vida.
contribuição decisiva para o conhecimento da depressão, mas lança uma
luz importante sobre as relações entre a emergência epidêmica dessa
forma de mal estar e os modos de subjetivação predominantes na cultura
norte-americana. Em uma sociedade onde as formações discursivas apagam o
sujeito do inconsciente, em que a felicidade e o sucesso são
imperativos superegóicos, a depressão emerge – como a histeria na
sociedade vitoriana – como sintoma do mal estar produzido e oculto pelos
laços sociais. O vazio depressivo, que em muitas circunstâncias pode
ser compensado pelo trabalho psíquico, é agravado em função do
empobrecimento da subjetividade, característico das sociedades
consumistas e altamente competitivas. A “vida sem sentido” de que se
queixam os depressivos só pode ser compensada pela riqueza do trabalho
subjetivo, ao preço de que o sujeito suporte, amparado simbolicamente
pelo analista, seu mal estar. A eliminação farmacológica de todas as
formas de mal estar produz também, paradoxalmente, o apagamento dos
recursos de que dispomos para dar sentido à vida.
Fonte: Texto retirado no site da psicanalista Maria Rita Kelh